Você está por dentro do escândalo que tem agitado o mundo nas últimas semanas?
O Facebook, a maior rede social da humanidade, se meteu em uma polêmica que fez seu valor despencar em mais de US$ 57 milhões em apenas uma semana.
Neste post vamos explicar, por partes, o que aconteceu, como o Facebook se envolveu em algo tão comprometedor e quais serão os desdobramentos daqui para frente.
Mais uma vez o motivo são problemas no controle da privacidade de seus usuários: assunto mais grave para uma plataforma que depende dos dados desses usuários para sobreviver.
É importante filtrar e desmistificar algumas informações que vêm sendo jogadas no ar, como sempre acontece em qualquer tipo de situação como essa.
Ao que parece, tudo começou em 2010, quando o Facebook abriu a API, para que as pessoas utilizassem a tecnologia chamada de open graph. Através dessa tecnologia, os criadores de aplicativos poderiam passar a ter acesso a dados de usuários que antes não tinham. E o pior, muitas vezes esses dados eram obtidos de forma pouco clara. Ao jogar algum jogo, ou utilizar algum aplicativo, só de clicar no botão de comando inicial você já compartilhava seus dados. O problema é que esse repasse nem sempre era feito de maneira clara ao usuário.
Em 2013, o pesquisador Aleksandr Kogan, da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, lançou um aplicativo de quiz que, através do Facebook, puxava os dados de seus usuários, como tantos outros aplicativos. O problema desse aplicativo é que, além de reter as informações daqueles que o utilizavam, também obtinha informação dos amigos dessas pessoas. De uma vez só, vários dados direta ou indiretamente foram coletados pelo Facebook e passados à empresa do Dr. Kogan, que então passava a ter informações de diversos usuários.
As pessoas foram percebendo que a API do open graph para o Facebook estava coletando muitos dados de diversos usuários e esse trâmite nem sempre era feito de maneira transparente. Em 2014, o Facebook fez a primeira grande revisão na API, tentando estabelecer limites de informações e esclarecendo aos usuários o que de fato estava sendo compartilhado. Porém o estrago já tinha sido feito. Com a abertura da API em 2010, o app do Dr. Kogan já possuía muitos dados de terceiros.
Em 2015, um ano após a revisão feita, o Facebook resolveu fechar o open graph. Para entender melhor sua função, um exemplo: quem utiliza muito o Facebook para trabalho deve se recordar de uma antiga funcionalidade disponível na plataforma, a de procurar amigos seus que curtiram fotos de terceiros. A rede social disponibilizava todas as informações das fotos que aquele usuário tinha curtido. Era possível utilizar as informações do Facebook para encontrar perfis de usuários, assim como suas buscas pessoais.
É bom deixar claro que é ótimo obter dados de usuário, até porque essa é uma poderosa arma para pesquisas, a fim de utilizá-las como base para estratégias de vendas, posicionamento etc. Quanto mais informações nós temos sobre usuários, mais fácil é veicular mensagens e campanhas significativas para essas próprias pessoas. O grande problema é fazer tudo isso sem o claro consentimento delas.
Ainda em 2015, enfim a primeira grande bomba. O jornal inglês The Guardian anunciou que a campanha presidencial do republicano Ted Cruz utilizou dados psicológicos de milhões de usuários do Facebook nos EUA. A empresa exigiu que a Cambridge Analytic destruísse as informações que coletou dos usuários do Facebook. No mesmo ano, o Facebook adotou um discurso de priorizar o conteúdo pessoal. Entregar conteúdos que levam mais a relações pessoais do que a marcas. O que se viu em 2017 foi uma queda expressiva do alcance orgânico de milhões de páginas, um reflexo desse posicionamento.
Os responsáveis pela campanha do então candidato e atual presidente norte-americano Donald Trump contrataram a Cambridge Analytics, a empresa que detinha os dados de usuários do Facebook, obtidos por conta do aplicativo do Dr. Kogan, para utilizar de seus recursos a favor da vitória de Trump. Lembrando que muitos desses dados foram obtidos de forma não explicitamente autorizada, como dito no início.
Além da expertise da Cambridge Analytics com todas as formas de pesquisa e apuração de dados, ficou difícil não apontar a utilização daqueles dados ilegítimos, e é aí que está todo o problema.
Segundo Mark Turnbull, um dos diretores da Cambridge Analytics, a empresa foi responsável pela campanha de exposição contra a rival de Trump nas eleições presidenciais norte-americanas, Hillary Clinton, no Facebook. A campanha levou o nome de Defeat Crooked Hillary (derrote a corrupta Hillary). Desde então já se percebia um movimento obscuro por parte da empresa em relação à corrida presidencial.
Voltamos aos dias de hoje para entender o que deu início a toda comoção e preocupação de milhares de americanos e, potencialmente, usuários do Facebook em todo o mundo.
Em uma matéria feita pelo New York Times há menos de um mês, foi revelado que a Cambridge Analytics ainda tinha os dados dos usuários, obtidos ainda na época do open graph ativo. O Facebook havia condicionado a continuidade do laço comercial com Cambridge Analytics à dissolução desses dados. Foi descoberto que a empresa mentiu sobre a eliminação das informações e então assim se deu início a toda investigação e alarde envolvendo o assunto.
O grande “vacilo” do Facebook foi pecar na verificação de uso desses dados pela Cambridge Analytics. Todos nós compartilhamos dados com plataformas digitais diariamente. Essa coleta feita por apps ou plataformas são conduzidas de maneira legal, a partir do momento que aceitamos (teoricamente depois de ler) os termos de uso. O Facebook ignorava qual o tipo de dado estava sendo utilizado e confiou cegamente na Cambridge Analytics. Mark Zuckerberg já concordou em ir até o congresso americano esclarecer alguns fatos sobre a utilização desses dados.
O Facebook fez uma mudança no layout a fim de deixar mais claro o ato de compartilhamento de dados. O usuário pode, a partir dessa modificação, marcar campos que autorizem o compartilhamento de certos dados, antes já compartilhados de maneira um pouco obscura pela plataforma.
No último dia 20 de março de 2018, o governo americano anunciou a abertura da investigação em cima do Facebook e da Cambridge Analytics. Como medida preventiva, o Facebook fez o que deveria ter feito anos atrás, sancionando a empresa de análise de sua plataforma. A Cambridge Analytics não está mais presente no Facebook.
No dia seguinte, 21 de março, Zuckerberg anunciou a implementação de uma nova ferramenta, que permite revogar permissões previamente concedidas de acesso aos dados pelos usuários a aplicativos. Os aplicativos só poderão manter os dados coletados por apenas 3 meses, depois desse prazo tudo deve ser apagado. O problema são os dados obtidos de maneira obscura em 2010, que ainda perduram na rede e não se sabe ao certo seu verdadeiro paradeiro.
Depois do ocorrido, surgiu na rede um movimento chamado #DeleteFacebook, incentivando as pessoas a se livrarem da rede social. Se o movimento realmente tomar forma, o impacto nos anunciantes será notado, e todo o giro financeiro no Facebook sofreria uma mudança. Empresas diminuindo e até retirando por completo o investimento em anúncios seria péssimo para a manutenção da plataforma. Esse cenário, porém, ainda é bem improvável, devido à fortíssima popularidade da rede social.
Ficou preocupado? O que fazer?
Verifique de cara todos os aplicativos que estão conectados ao seu perfil. Você pode acabar percebendo que em algum momento você pode ter se conectado a algum deles que você não utiliza e que não há a menor necessidade de estar ali. Ótimo momento para remover esse app e deixar de compartilhar suas informações à toa. Essa dica também vale para o Twitter, que segue o mesmo princípio. Muitas vezes criamos uma espécie de lixeira de apps, por tanto é sempre bom dar aquela revisada.
Como disse o próprio Alexander Nix, um dos donos da Cambridge Analytics, seu propósito era partir para uma guerra eleitoral, nos Estados Unidos e outro lugares do mundo, incluindo o Brasil. Então é importante alertar a todos e pedir atenção a tudo que recebemos que possa servir de coletor de dados. Filtre suas informações, entenda por onde está navegando, verifique para quais aplicativos está cedendo dados etc. Não feche as portas para a evolução, pois a coleta de dados também é importante para as melhorias e benfeitorias digitais, mas saiba se livrar daquilo que não te agrega.
O Facebook sempre tenta apaziguar as coisas em momentos de crise, com atualizações e medidas que protejam o usuário. Em 2017, por exemplo, a plataforma desabilitou algumas segmentações de comportamento para evitar buscas por entre usuários com interesses em assuntos que violam as regras de uso, como nazismo e outros assuntos de teor proibitivo. Mais recentemente ocorreu um problema com alguns gifs do Instagram, que foram banidos após serem apontados como disseminadores de conteúdo racista. Apesar de fazer parte do grupo Facebook, é bom destacar que o Instagram não está envolvido nos escândalo de dados da Cambridge Analytics. É importante saber que mesmo duas empresas geridas pelo mesmo grupo têm suas diretrizes próprias, além de o Instagram ser uma plataforma mais nova do que o próprio Facebook.
Procure ficar sempre de olho no tipo de aplicativo ao qual você entrega seus dados, certifique-se de que você necessita realmente de todos os aplicativos aos quais já está cadastrado e LEIA OS TERMOS DE USO, por mais chatos que pareçam. Todo esse desenrolar ainda é muito recente e, após os esclarecimentos do CEO do Facebook ao governo norte-americano, esperamos que mais notícias surjam e que os usuários se sintam mais seguros para compartilhar dados e dar seguimento à evolução digital para o bem de todos.
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